segunda-feira, 12 de abril de 2010

PEDAÇOS DE VIDAS

Angelino dos Santos Silva

pedaços de vidas

romance

Contacto com o autor:

angelinosantossilva@gmail.com

Telem: 93720399

homenagens:

§ Aos Camaradas que partilharam os dias difíceis da Guerra de África!

§ Aos Camaradas que por lá deixaram uma parte de si : Os Mutilados!

§ Aos Camaradas que por lá deixaram tudo de si: A VIDA!

§ Aos Camaradas que regressaram mais velhos em anos, do que os meses que lá viveram e lá deixaram o melhor de si: A Saúde!

§ Às Vítimas desse Sentimento Egoísta e Mesquinho que dá pelo nome de Ciúme, hipocritamente confundido com Amor e desejar que o tema seja objecto de preocupação pela Sociedade e que o mesmo seja estudado com a Inteligência e a Urgência que o Tema merece!

dedicatória

a

Pedro e Sofia

Meus filhos

30 Abril de 2009

agradecimentos:

a

tina

ângelo

anamaria

dina

esmeralda

isabel

sem a vossa bondade, este romance

ficaria prisioneiro na cabeça.

30 Abril de 2009

A

Paulinha

minha querida sobrinha e afilhada, hoje falecida,

o meu agradecimento, já cheio de saudade.


O teu sorriso escondia a tristeza que te ia na alma.

Os teus passos percorriam o espaço que te fugia.

E o teu olhar, procurava de forma serena e calma,

Enganar a morte que dia a dia à porta te batia!


Descansa em paz!

22 de Setembro de 2009


ÍNDICE


I PARTE

Cap. Pag.

1. UMA QUESTÃO DE SAIAS

2. CONFUSÕES

3. GUIA DE MARCHA

4. A SORTE DO ZEQUINHA

5. TELEFONEMA

6. CONVERSÃO DE LETINHA

7. ARREPIOS

8. CABELOS E CHEIROS

9. ENCONTROS

10. A MINHA IRMÃ, DISSE-ME

11. SUAVE BRISA

12. ESQUECIMENTO

13. PESADELO

14. ESCRITORA

15. DECISÃO

16. PAZ PODRE

17. SURPRESAS

18. SÓ PODE SER ISTO

19. BOAS VINDAS

20. REUNIÃO

21. DURMAM BEM

22. INTRANSIGÊNCIA

23. SORTEIO

24. O FIO DA MEADA

25. ENCONTRO

26. DECISÃO

27. QUASE FIQUEI SEM PELE

28. MUDAR DE TRANSPORTE

29. FRUTO PROIBIDO

30. AVIÃO SEM MALA

31. DOR DE BARRIGA

32. JUAN GUTIERRES

33. O MENINO

34. DINHEIRO DE GRILO

35. RESPIRAR FUNDO

36. UM SONHO

37. MONÓLOGOS

38. CRUELDADE

39. REGRESSO

40. CRUELDADE

41. CARTA A GARCIA

42. ACHINCALHO

43. METE A LÍNGUA

44. REFRESCAR AS IDEIAS

45. A GUERRA NÃO FOGE

46. TRISTE NATAL

47. AQUELE OLHAR

48. TENHA JUÍZO

49. MAMÃE NÃO CHORES

50. PODE SENTAR-SE


II PARTE


Cap. Pag.

1. ATÉ AO MEU REGRESSO

2. IR À BRUXA

3. TOP SECRET

4. NÃO PERCEBO

5. DATA MARCADA

6. FALSA , NÃO COMO JUDAS

7. DECIDIR DA HISTÓRIA

8. PEDAÇOS DE VIDAS

9. SERIA DO FRIO?

10. RIR PARA DENTRO

11. CAIS DE PARTIDA

12. JÁ TE COMI

13. MELHOR CAMA

14. AS PÉROLAS

15. É ASSIM QUE NOS TRAMAM

16. SABES, AMOR?

17. A BRISA DA INCERTEZA

18. SIMPLES, NÃO É?

19. PIDJIGUITI

20. ASSALTO FINAL

21. ESTIVE EM AFRICA

22. PORQUÊ?

23. ESQUISITO

24. ESTOU-ME NAS TINTAS

25. O PILÃO

26. A CORJA

27. BULA

28. VAMOS LAVAR ROUPA

29. SE NOS APANHAM

30. PEÕES DE BREGA

31. SANTUÁRIO

32. MENTIRA

33. VOZ CELESTIAL

34. VOZ ELOQUENTE

35. GUERRA PSICOLÓGICA

36. NÃO ME DEIXAM

37. LÁGRIMAS DE MACACO

38. CHORO

39. DOMINGOS DJALÓ

40. CRIANÇA FELIZ

41. MADRUGADA TROPICAL

42. CAIM NÃO MATOU

43. VIAGEM AO SUL

44. DEFENDER A VERDADE

45. MORTE FORA DE HORAS

46. INQUISIÇÃO

47. REGRESSO AO NORTE

48. DESCONTROLO

49. MORTE PELA METADE

50. BESTAS EM DESASSOSSEGO


III PARTE


EPÍLOGO

Pag. NOITE AO LUAR



0

Esta é a história de António Daborda e Augusto Marques, gente simples de um Povo que ao longo dos tempos construiu com o seu esforço e sua ambição um País, mas que nunca soube ou foi incapaz de reivindicar o seu nome e lugar na História.

- Sabe, Padre – diz António para o seu Capelão – a nossa desgraça começa na Grande Aventura que foram os Descobrimentos. Preguiçamos o cérebro perante a grandeza da Coisa! Somos um Povo, que aceita sem sentido crítico, que lhe seja ensinado que a História é feita por heróis afonsos, gamas, pereiras e oliveiras. Nunca reivindicamos o nosso nome e lugar na História.

Frustrados por terem sido impedidos de sair do navio e obrigados a permanecer ao largo no Porto de Funchal no dia 31 de Dezembro de 1971, com o argumento de que poderiam causar incómodos aos turistas, em noite de festa de fim de ano!

- Veja Padre – diz António – somos dois mil homens a bordo e não somos capazes de reivindicar o respeito e o reconhecimento que merecemos. Que merecem os nossos Camaradas que por lá deixaram tudo de si: A Vida!

Esta conversa teve lugar a bordo do navio que trazia de regresso a casa, António Daborda e seus camaradas, após dois anos de guerra em África!

É a história de Mário Oliveira e Maria Carolina, sua esposa, pedaços de vidas de qualquer um de nós, que deveriam ser simples, alegres e descomplicados e que são transformados em episódios de vidas difíceis e infernais, provocadas por obsessões esquizofrénicas, invejas e rancores e por gente sem ética e sem princípios que se aproveita da miséria e da besta que em todos nós mora, para se promover socialmente!

Em tribunal, Mário diz:

- Há pessoas incapazes de gostarem de alguém.

Olham-se ao espelho e vêm-se narcisos.

Para além do seu umbigo, o mundo é um caos.

Têm como filosofia, primeiro eu, segundo eu e terceiro…eu e quem não é por mim é contra mim.

Só os bajuladores têm assento na sua mesa.

E quando o efeito narcótico entra em ressaca, voltam ao reflexo e nele, convencem-se, uma vez mais, de que são únicos!

Normalmente, acabam em depressão.

Acredito que a minha ex-esposa pertença a este grupo.



1

UMA QUESTÃO DE SAIAS

(Abril de 1969)

§ Não sei, se calhar é por não casarem.

- Então e agora?

- Agora, conserta-se a cadeira e senta-se outro nela e fica tudo na mesma – diz António Daborda.

Quem pergunta é Augusto Marques, moço da idade de António e ambos em idade da tropa.

As perguntas vêm de pequeninos. Amigos de sempre, Augusto habituara-se às respostas de António, tomando-as como certas.

- Como é que sabes isso? – Perguntava Dona Rosalina dos Carvalhos ao seu menino Augustinho.

- Disse o António! – e pronto. Era lei!

- E porque é que o senhor abade anda de saias e os outros homens não? - perguntava Augusto, nos seus sete anos de inocência aos sete anos de ciência de António.

- Não sei, se calhar é por não casarem. A minha mãe diz que os padres não podem casar e não podem ter filhos, se calhar é por isso!

- Mas as mulheres andam de saias e têm filhos, não vêm da cegonha, como diz o Hélder da tijaquina, vêm da barriga das mulheres, que eu espreitei a minha mãe com a barriga cheia e pernas abertas a gritar para ter a nossa Rosa!

- Sim, sim, eu sei, a minha mãe já me contou que os bebés nascem da barriga das mulheres, mas os padres não podem ter filhos... se calhar é por isso.

- Pode ser, mas o meu pai diz que o senhor Prior, o outro senhor Abade que se foi embora da nossa terra, tinha um afilhado que era filho dele e da criada. Eu pensei que a criada era a mulher dele!...

Este interessante diálogo sobre questões de saias foi anos atrás, tempos de meninos da primária, entre António Daborda e Augusto Marques. Diálogos, perguntas e respostas que se prolongaram pela mocidade fora. Hoje, homens feitos, lâmina na cara, mancebos prestes a iniciar o serviço militar, o tema é mais sério, embora se trate de uma simples queda de cadeira. Uma queda, que podia ter mudado muita coisa… e que não mudou!

António desconfiava que não e por isso, à incerteza de Augusto, responde com a sua certeza desconfiada:

- Agora… senta-se outro nela e fica tudo na mesma! A única coisa que muda para os jovens como nós, é que daqui a alguns meses estaremos a combater em África – acrescenta – e provavelmente iremos para sítios diferentes!

Resposta dada, resposta aceite. Augusto sempre dera como certas as respostas do António e não era agora que iria duvidar do seu amigo, mais a mais, estudante. Estudante, dos poucos da sua aldeia cujos pais tiveram a ousadia e desfaçatez de mandar filhos de pobres estudar na grande cidade capital do distrito! e, ao que dizem, muito aplicado. Disso não duvidava Augusto Marques que tinha bem presente os desenrascanços que o seu amigo lhe proporcionara na primária, quando apertado pelo professor, figura severa e implacável, surdo que nem uma porta, mão peluda, grossa, que mais parecia pata de elefante e que sem aviso prévio, sacudia com um pesado safanão as frágeis cabeças dos mais distraídos, deixando-as aturdidas, Zum zum, sua bestinha quadrada, já devia ter respondido.

Ainda não tinha acabado o zum, zum, sua best… já a pata de elefante tinha sacudido a frágil cabeça do distraído, que era distraído por não saber a resposta. Nestas alturas, Augusto, que morava ao lado na carteira de António, seu companheiro de classe, tentava adivinhar a pergunta do surdo professor e com o cotovelo, perguntava a António a resposta para pergunta adivinhada e, deste modo, tentava safar-se do terramoto sobre a sua confusa cabeça. Variadíssimas vezes este expediente resultou. Outras, não!

Agora, na idade de mancebos, em vésperas de ingressarem na tropa, os jornais falavam da queda. Timidamente. E Augusto quer saber coisas.

- Então, achas que fica tudo na mesma?

- Claro, vais ver que sim, continuas a trabalhar nos campos com o teu pai, eu continuo a estudar, a guerra nas províncias ultramarinas continua e nós vamos para a tropa quando nos chamarem e de certeza que vamos lá bater com os costados. Pena é que, provavelmente, não iremos para o mesmo sítio, mas até pode ser que sim, que nos encontremos lá por África.

Sem comentários:

Enviar um comentário