segunda-feira, 12 de abril de 2010

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GUIA DE MARCHA

§ ..e não te armes em herói, rapaz!

- Fui à Junta da Freguesia ver o Edital. Vou assentar praça em Abril, vou para as Caldas e tu vais para Santarém – diz António a Augusto – o senhor abade anunciou na missa que já estavam afixadas as incorporações e dei um salto à junta de freguesia para ver. Vou no dia 25 para as Caldas da Rainha e tu vais para Santarém, mas não fixei o dia.

- Ah, está bem, obrigado – diz Augusto – de tarde passo na Junta para ver. Depois combinamos e vamos os dois na segunda ou terça-feira ao governo-civil buscar as Guias de Marcha.

Era um domingo por hora do jantar[1] e António tinha ouvido a notícia na missa da manhã. O senhor abade tinha lido na homilia. Augusto, moço de poucas missas, tinha ido pescar e desconhecia a novidade. No entanto, não ficou de todo admirado, pois sabia que a coisa estava para breve. Outros da terra, colegas da mesma idade, já se apresentavam na missa de cabeça rapada e, vaidosos, vestidos de militares, falavam com entusiasmo do embarque para Angola. No adro da igreja, os mais entusiastas e gabarolas, rodeados da pequenada que lhes tocava com a mão como se fossem heróis dos filmes de cowboys, falavam das façanhas que iriam protagonizar:

- Quando lá chegar, vou dar cabo daquilo tudo. Vou dar cabo de todos aqueles turras! Vou partir tudo! – afirmavam.

- Então rapaz, ouvi dizer que tens data marcada para embarcares para Angola.

- Sim tio, vou embarcar no próximo dia dezanove! Para a semana passo lá por casa para me despedir.

- Está bem, está bem, não te armes em herói, rapaz! Olha que o teu pai precisa de ti! Sabes que lá em casa há muitas bocas para sustentar e o teu irmão não ganha nada de jeito! Não te armes em herói, tem juízo nessa cabecinha – repetia o tijaquim da tidiolinda, homem de bom senso, em vésperas do embarque do sobrinho.

Entusiasmados com a perspectiva de combaterem em África, defendendo a Nação contra os turras, António e Augusto tinham o desejo de irem juntos para a mesma província ultramarina.



[1] Na aldeia de António JANTAR era a refeição do meio-dia.

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